Atenção Plena, Êxtase, e Mais Além (3)

Atenção Plena, Êxtase, e Mais Além
Um Manual do Meditador
Ajahn Brahm

Anterior – Capítulo 3, Parte 1: Os Obstáculos à Meditação I (início)
Capítulo 3, Parte 2: Os Obstáculos à Meditação I (conclusão)

Capítulo 4a

Os obstaculos à Meditação II

Voltamos agora para os três restantes obstáculos – preguiça e torpor (Thina-middha), inquietação e ansiedade (uddhaccakukkucca) e dúvida (vicikicchâ) e, em seguida, examinamos o que acontece quando os obstáculos são superados.

O Terceiro Obstáculo – Preguiça e Torpor

O terceiro obstáculo é preguiça e torpor. Não preciso descrevê-lo em detalhes, porque tenho certeza que nós o conhecemos muito bem através da nossa experiência de meditação. Sentamos em meditação e realmente não sabemos o que estamos vendo, se é o momento presente, o silêncio, a respiração, ou o que quer que seja. Isto é porque a mente está apagada. É como se não há luzes acesas lá dentro. É tudo cinza e embaçada.

Fazendo a paz com preguiça e torpor

A maneira mais profunda e eficaz de superar a preguiça e o torpor é fazer as pazes com o torpor e parar de lutar com ele! Quando eu era um jovem monge nos mosteiros da floresta na Tailândia e ficava sonolento durante a meditação das 3h15 da manhã, eu lutava como o diabo para superar o torpor. Normalmente fracassava. Mas quando conseguia superar a minha sonolência, inquietação iria substituí-lo. Então, acalmava a inquietação e caía novamente em preguiça e torpor. Minha meditação era como um pêndulo oscilando entre os extremos e nunca encontrando o meio. Levei muitos anos para entender o que estava acontecendo.

O Buda defendia a investigação, não a luta. Então, eu examinei de onde veio a minha preguiça e torpor. Eu vinha meditando às 3:15 da manhã, depois de ter dormido muito pouco, estava desnutrida, um monge Inglês numa selva tropical quente – o que podia esperar! O torpor era o efeito de causas naturais. Abri mão e fiz as pazes com a minha sonolência. Parei de lutar e deixei minha cabeça cair. Quem sabe, eu possoa até ter roncado. Quando parei de lutar contra a preguiça e torpor, este não durava tanto tempo assim. Mais ainda, quando passava, eu ficava com paz e não com inquietação. Eu havia encontrado o ponto do meio do meu balanço do pêndulo e pude observar a respiração facilmente a partir de então.

Embotamento da mente na meditação é o resultado de uma mente cansada, geralmente um que vem trabalhando em excesso. Lutar contra este embotamento faz você ficar ainda mais exausto. Descansar permite que a energia retorne para a mente. Para entender este processo, vou agora apresentar as duas metades da mente: o conhecedor e o fazedor. O conhecedor é a metade passiva da mente que simplesmente recebe informações. O fazedor é a metade ativa que responde com os atos de avaliar, pensar e controlar. O conhecedor e o fazedor compartilham da mesma fonte de energia mental. Assim, quando você está fazendo muitas coisas, quando você tem um estilo de vida agitado e está lutando para chegar lá, o fazedor consome a maior parte de sua energia mental, deixando apenas uma ninharia para o conhecedor. Quando o conhecedor está carente de energia mental, você sente embotamento.

Em um retiro que liderei em Sydney, há alguns anos, um retirante chegou tarde do seu trabalho de alto estresse como executiva na cidade. Em seu primeiro período de meditação naquela noite sua mente estava quase tão morta quanto um cadáver. Então, dei-lhe o meu ensinamento especial de como superar sua preguiça e torpor: Eu disse a ela para descansar. Para os próximos três dias, ela dormia até de madrugada, voltou para a cama novamente após o café da manhã, e teve uma longa soneca depois do almoço. Que meditador brilhante! Depois de três dias sem lutar, dando quase nenhuma energia mental para o fazedor, mas deixando a energia fluir para o conhecedor, sua mente se clareou.Em mais três dias, ela havia alcançado o resto do grupo no seu progresso através dos estágios.Até o final do retiro ela estava à frente e um dos meditadores estrela desse retiro.

A maneira mais profunda e eficaz para superar a preguiça e o torpor é parar de lutar com a sua mente. Pare de tentar mudar as coisas e, em lugar disto, deixe as coisas serem como são. Faça a paz não a guerra com preguiça e torpor. Então, sua energia mental ficará liberada para fluir para o conhecedor, e sua preguiça e torpor irão naturalmente desaparecer.

Dar valor à consciência

Outro método para superar a preguiça e o torpor é dar mais valor à consciência. Todas as tradições budistas dizem que a vida humana é valiosa e preciosa, especialmente uma vida como esta, onde você encontrou os ensinamentos do Buda. Agora você tem a oportunidade de praticar. Você pode não perceber quantas vidas foram necessárias e quantos méritos você teve que acumular simplesmente para chegar aonde você está agora.Você investiu vidas de bom karma para chegar assim perto do Dhamma. Refletir desta forma significa que você vai tem menos inclinação para a preguiça e torpor e mais a consciência clara.

O caminho da meditação, às vezes chega a uma bifurcação na estrada. O caminho da esquerda leva a preguiça e torpor, enquanto o caminho da direita conduz a consciência clara. Com a experiência, você vai reconhecer este bifurcação. Este é o ponto ns meditação onde você pode escolher entre o beco à preguiça e torpor ou a estrada à quietude consciente. Tomando o caminho da esquerda você desiste de ambos, o fazedor e o conhecedor. Tomando o caminho da direita você abre mão do fazedor, mas mantem o conhecedor. Quando você valoriza a consciência, irá escolher automaticamente o caminho da direita de consciência clara.

Preguiça e Torpor e má vontade

Às vezes, a preguiça e torpor é o resultado de má vontade, o segundo obstáculo. Quando eu costumava visitar as prisões australianas para ensinar meditação, eu ouvi muitas vezes o provérbio prisão seguinte: “uma hora extra de sono é uma hora tirada de sua sentença.” As pessoas que não gostam de onde estão tentarão escapar para o embotamento. Da mesma forma, os meditadores que facilmente se tornam negativos terâo a tendência de cair na preguiça e torpor. A má vontade é o problema.

Em nosso mosteiro na Tailândia nós meditávamos a noite inteira uma vez por semana. Durante essas sessões da noite inteira, a preguiça e torpor regularmente me derrotavam uma ou duas horas após a meia-noite. Desde que era o meu primeiro ano como monge, eu refleti que fazia menos de 12 meses que eu passava a noite inteira em festas, shows de rock, e boates. Lembrei-me de que eu nunca experimentei preguiça e torpor ao ouvir a música dos Doors às duas horas da madrugada. Por quê? Ficou claro que quando você está desfrutando o que você está fazendo, então você não tende a ter preguiça e torpor, mas quando você não gosta do que está fazendo, preguiça e torpor vem logo em seguida. Eu não gostava daquelas sessões de meditação da noite inteira. Eu achava que eram uma ideia estúpida. Eu as fazia porque não tinha escolha. Eu tinha má vontade, e esta era a causa da minha preguiça e torpor. Quando eu mudei a minha atitude e coloquei a alegria nas sessões da noite inteira, tornando-as divertidas, então a preguiça e torpor raramente veio. Então, você deve investigar se o seu preguiça e torpor é o resultado de problema de atitude – a atitude de má vontade.

Usando o Medo

Quando eu era um budista leigo participei de um retiro Zen na norte da Inglaterra. Era muito cedo da manhã, e a sala de meditação estava congelando de frio.As pessoas tinham seus cobertores em torno deles. Quando você medita com um cobertor em qualquer lugar perto de você, você tende a ficar sonolento. O professor ficou andando para cima e para baixo com um pau grande, e o companheiro ao meu lado que tinha começado a “pescar” recebeu uma batida. A preguiça e torpor de todos repentinamente desapareceu naquele instante.Nós só precisávamos que uma pessoa fosse batida e foi o suficiente. O problema foi que o medo que me acordou permaneceu comigo, impedindo maiores progressos. A experiência ensina que você não pode gerar estados benéficos como a paz e a liberdade, usando métodos não saudáveis como o medo ou a violência.

Na tradição antiga da floresta do nordeste da Tailândia, monges meditam em lugares perigosos, tais como plataformas no alto das árvores, à beira de penhascos, ou em selvas cheias de tigres. Os que sobreviveram disseram que tiveram boa meditação, mas você nunca ouviu falar dos monges que não sobreviveram!

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Tradução e Revisão Final: Monja Isshin
Revisão do Português: Ananda Feix Ribeiro

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